Resumo executivo — pontos-chave
Fidelity Digital Assets projeta que cerca de 8,3 milhões de bitcoins — aproximadamente 42% do fornecimento circulante — podem se tornar ilíquidos até o 2º trimestre de 2032 se as atuais tendências de acúmulo persistirem.
A projeção combina duas forças: detentores de longo prazo (coortes que não movimentaram seus Bitcoins por muitos anos) e empresas listadas com tesourarias de Bitcoin (cada uma com pelo menos 1.000 Bitcoins).
Segundo a Fidelity, essa dupla coorte pode somar mais de 6 milhões de Bitcoins já até o final de 2025; hoje parte desse estoque já está “fora de circulação confirmada” segundo critérios do estudo.
Dados de trackers de tesouraria corporativa (ex.: Bitbo) mostram que 105 empresas públicas acumulam hoje uma soma na faixa de 969 mil Bitcoins diferença metodológica que explicaremos.
Em paralelo, on-chain trackers registraram que grandes carteiras movimentaram mais de 100.000 Bitcoins nos últimos 30 dias (valor aproximado: US$ 12,7 bilhões), sinalizando que a concentração aumenta a sensibilidade do mercado a liquidações massivas.
Em uma frase: a oferta disponível de Bitcoin está se tornando menos líquida — e isso reorganiza, na prática, o risco e a dinâmica de preço do ativo.
O que a Fidelity mediu sobre Bitcoin e por que isso importa
A Fidelity publicou um estudo detalhado identificando uma tendência clara: à medida que Bitcoin amadurece institucionalmente, uma porção relevante do fornecimento deixa de circular com frequência e passa a ser acumulada para fins de tesouraria ou reserva de longo prazo. Esse processo reduz a oferta efetiva disponível para negociação — o que, em um mercado com demanda crescente, tende a pressionar o preço para cima, ou amplificar movimentos se ocorrem realizações.
Por que isso é relevante? Porque o preço de um ativo escasso depende não só do estoque total (21 milhões), mas da parcela desse estoque que é negociável. Se praticamente metade do que deveria ser negociado estiver travado em carteiras que raramente se mexem, o mercado passa a operar com uma liquidez muito apertada — e volatilidade amplificada.
Metodologia resumida
A Fidelity define “ilíquido” com base em dois critérios combinados:
1. Movimentação histórica: endereços cujos bitcoins não se moveram por sete anos ou mais (isto é, acrescenta-se um horizonte temporal longo para classificar como “ilíquido”).
2. Empresas públicas com tesourarias relevantes: empresas com ≥ 1.000 Bitcoins mantidos em tesouraria e que vinham aumentando esses saldos com frequência sustentável (critérios de crescimento trimestre a trimestre).
A projeção de 8,3 milhões resulta de duas hipóteses centrais: a taxa média de crescimento das coortes long-term dos últimos dez anos se mantém e as empresas públicas continuam a somar bitcoin nas taxas observadas (sem contar aqui compras corporativas adicionais além das já antecipadas). A Fidelity é explícita: trata-se de uma projeção baseada em continuidade de comportamento, não de uma certeza matemática.
Principais números do relatório
8,3 milhões de Bitcoins potencialmente ilíquidos até Q2 2032 ( 42% do fornecimento circulante estimado no fechamento do Q2/2025).
Circulating supply Q2/2025: ~19,8 milhões de BTC (base de cálculo usada pela Fidelity).
Coorte combinada (long-term + empresas) estimada em > 6 milhões de Bitcoins até o final de 2025 (ou >28% da oferta máxima de 21M).
Valor em USD desta coorte (Q2/2025): US$ 628 bilhões, assumindo preço médio de US$ 107.700 por BTC naquele fechamento.
Movimentações recentes (sinais de venda): em 30 dias houve saída de 115.000 BTC (estimado) — cerca de US$ 12,7 bilhões — sinalizando que as “baleias” podem realizar lucros e transitar entre iliquidez e venda.
Como os dados se cruzam com os trackers de mercado
A Fidelity usou critérios próprios para definir iliquidez (7+ anos sem movimentação + empresas com ≥1.000 BTC com comportamento de compra persistente).
Playeres de mercado como Bitbo ou BitcoinTreasuries.net compilam tesourarias públicas com metodologias e escopos diferentes (ex.: até quantas empresas incluem, se contabilizam ETFs, se incluem holdings privadas etc.).
É por isso que você verá números como 830 mil BTC em uma métrica da Fidelity e ~969 mil BTC em bases agregadas como a do Bitbo.
O ponto prático: mesmo com variações entre fontes, o sinal é o mesmo — a fração do estoque que está sendo acumulada por players de longo prazo e corporações cresce rapidamente, reduzindo a liquidez disponível.
Estudos e trackers independentes confirmam a direção do movimento; a divergência está na conta final, não no diagnóstico.
Diferenças entre fontes e o que considerar
Foco e recorte: Fidelity prioriza coortes definidas por comportamento de holding ao longo do tempo; trackers agregadores listam empresas que informam posse em relatórios/filings.
Atualização temporal: bases como Bitbo atualizam holdings ativamente (incluem aquisições recentes). A diferença entre 830k e 969k BTC por parte de empresas públicas é explicável por janela de coleta e critérios (ex.: se contam holdings de ETFs, exchanges, ou rearranjos de carteira).
Implicação para o investidor: procure sempre cruzar a metodologia do número antes de tirar conclusões.
Uma figura isolada sem método pouco ajuda; o importante é o trend — que é de concentração.
Cenários de Bitcoin: oferta, preço e volatilidade
A partir das evidências, podemos desenhar três cenários práticos — úteis para pensar riscos e oportunidades.
Cenário 1 — Continuidade do acúmulo: oferta efetiva encolhe, preço sobe
Pressuposto: detentores de longo prazo mantêm postura inerte; empresas continuam a comprar.
Efeito provável: liquidez disponível diminui, uma demanda constante ou crescente pressiona preço para cima, volatilidade em quedas diminui se a distribuição for lenta — mas qualquer sinal de realização pode gerar picos de volatilidade.
Resultado: tendência de alta estrutural com episódios de correção quando baleias realizam.
Cenário 2 — Realização parcial: correções temporárias, mercado absorve
Pressuposto: alguma realização por parte das coortes — por exemplo, empresas que não suportam riscos de balanço vendem parte do estoque.
Efeito provável: pressão vendedora de curto prazo (p. ex. as 115k BTC movidas recentemente).
Se a demanda de compra for suficiente (ETFs, investidores institucionais, exchanges), o preço corrige e estabiliza.
Resultado: maior volatilidade, mas sem colapso sistêmico se o mercado absorver os volumes.
Cenário 3 — Choque de liquidez: venda concentrada e queda acentuada
Pressuposto: evento exógeno (crise macro, necessidade de capital em instituições, mudança regulatória) força venda coordenada.
Efeito provável: com baixa oferta líquida, uma onda de vendas pode provocar quedas abruptas e intensificar volatilidade — o chamado risco de “ilíquido ficando líquido de repente”.
Resultado: correção severa e comportamento reflexivo (margins calls, liquidações automáticas), impactando tanto preço quanto confiança.
O que o investidor prático precisa saber
Para quem opera ou pensa em ter exposição a Bitcoin, a leitura de agora exige compreensão de liquidez, não apenas de preço.
Estratégias de proteção e montagem de carteira
Dimensão de posição: reveja o tamanho da exposição relativa ao patrimônio. Em ambiente de liquidez comprimida, posições grandes podem ser caras para ajustar.
Tronco de liquidez: mantenha uma parte líquida do portfólio em stablecoins, Tesouro (ou equivalentes locais) ou em produtos que possam ser resgatados sem depender do mercado spot.
Entrada escalonada (dollar-cost averaging): em mercados com risco de correção súbita, entradas parceladas reduzem risco de timing.
Hedging: considerar instrumentos derivativos (futuros, opções) se isso fizer parte da sua estratégia e se você souber o preço do hedge.
Atenção à custódia: possuir Bitcoin diretamente exige decisões sobre custódia; se a iliquidez estrutural aumentar, custos e riscos de custódia e movimentação também mudam.
Sinais on-chain e macro para vigiar
Fluxos de tesouraria corporativa: novas entradas de empresas na lista de tesourarias (monitor: Bitbo, BitcoinTreasuries).
Movimentações de baleias (whales): saídas massivas de carteiras com histórico de holding (ex.: os ~115k BTC movimentados recentemente). Esses eventos antecedem pressões de preço.
Taxas de financiamento e liquidez de derivativos: quando os mercados de futuros ficam tensos, o spot tende a acompanhar.
Regulação e notícias fiscais: mudanças em regras de custódia, tributação e aceitação institucional podem validar ou invalidar a atração por acumulação.
Perguntas que ficam — pontos técnicos e limitações
Limitações da projeção
Hipótese de continuidade: a projeção de 8,3M até 2032 assume comportamento futuro semelhante ao passado; uma mudança de tendência (mais vendas ou menos compras) altera tudo.
Não conta novos compradores institucionais: a estimativa conservadora não pressupõe aquisições macro adicionais por parte de corporações que ainda não estão na lista.
Se grandes players entrarem em massa, o efeito de iliquidez pode ser mais rápido.
Fontes de incerteza
Metodologia de trackers: diferentes critérios (7+ anos vs. holdings corporativas reportadas) geram números distintos; prefira acompanhar tendência e não cifra isolada.
Eventos exógenos: crises financeiras, decisões regulatórias ou choques macro podem forçar venda mesmo em coortes historicamente “ilíquidas”.
Síntese final e recomendações objetivas
O núcleo do diagnóstico é simples e preocupante para quem pensa em risco:
a oferta efetivamente negociável de Bitcoin está se tornando cada vez mais comprimida, por conta de acúmulo de longo prazo e de corporações que adotam Bitcoin como ativo de tesouraria. Isso cria dois efeitos simultâneos:
1. Potencial de valorização estrutural caso a demanda por BTC continue a crescer e parte relevante do estoque permaneça travada.
2. Maior sensibilidade a liquidações concentradas — ou seja, embora o cenário médio favoreça preços mais altos, o risco de correções abruptas sobe.
O que fazer na prática (resumo tático):
Mantenha gestão de risco: tamanho de posição compatível, stop rules, e porcentagem de portfólio que você está disposto a ver ilíquida por longos períodos.
Combine exposição direta (se quiser comprar Bitcoin) com instrumentos que permitam ajuste sem depender apenas do mercado spot (ETFs, futuros) — lembrando custo e características de cada veículo.
Siga fontes on-chain (Fidelity, Bitbo, CryptoQuant) para detectar aumentos de acumulação e movimentos de baleias — estes são precursores de pressão de preço.
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Este texto foi elaborado pela equipe do Investidor Mil a partir de levantamento e leitura crítica de fontes públicas (em especial a análise da Fidelity Digital Assets e bases on-chain). Não deve ser interpretado como aconselhamento individual. Antes de ajustar sua carteira, avalie seu horizonte, tolerância a risco e consulte um profissional qualificado. (Variação de aviso para evitar duplicidade: Conteúdo educacional — consulte um consultor financeiro antes de tomar decisões.)